Vou confessar uma coisa: eu sinto falta de escrever cartas. Sim,
mesmo respirando tecnologia quase que 24 horas por dia, o que me
aproxima de 90% das pessoas pra quem eu gostaria de escrever, sinto
falta de escrever cartas para elas.
Não sou tão velha assim, mas sou do tempo em que…
…quando queriam ganhar um brinquedo, as crianças mandavam cartinhas para o programa de sua apresentadora infantil preferida.
… para participar de promoções, as mães recortavam embalagens de
macarrão e mandavam para uma determinada caixa postal até uma data
específica e ficavam ansiosas pelo sorteio ao vivo no intervalo da
novela das oito.
… os casais apaixonados escreviam suas declarações por cartas enviadas sempre em papéis bonitos e, às vezes, até perfumados.
… os que queriam se declarar, mas não tinham coragem, escreviam cartas que dificilmente seriam enviadas.
… amigos distantes contavam novidades por cartas que demoravam a
chegar. Mal recebíamos uma, já ficávamos à espera do que viria nas
próximas.
… amigos adolescentes trocavam segredos por cartinhas em folhas de caderno arrancadas durante a aula.
… colecionávamos os mais belos papéis para enviar às pessoas mais queridas.
Não que eu não goste da facilidade e da rapidez com que a internet
me proporciona acesso às pessoas queridas (ou não), mas há certa
impessoalidade nestas relações, certo distanciamento.
Cada vez que vejo um recado, um post, um tweet, fico imaginando como
seria a letra de quem escreve – será a caligrafia redondinha ensinada
antigamente na escola ou a letra de forma objetiva ou a incompreensível
letra de médico? -, em que papel estariam escritas aquelas palavras…
será que, no espaço da página em branco, seriam mesmo aquelas as
palavras escolhidas….
Quando eu era adolescente, havia seções em algumas revistas (como a
Rock Brigade) destinadas à troca de correspondência. Funcionava assim:
caso quisesse se corresponder com pessoas de diversos lugares, com
interesses em comum, você mandava seu endereço para a seção e, depois
de publicado, as pessoas começavam a trocar cartas. Era o tal do penpal
americano em verão nacional. Nunca mandei meu endereço por não gostar da exposição, mas, certa
vez, no curso de inglês, a professora passou o endereço de uma garota
que morava em New Jersey e que gostaria de se corresponder com os
alunos. Aproveitando a oportunidade para treinar nosso inglês, eu e os
outros alunos começamos a escrever.
A ansiedade adolescente deixava a situação ainda mais emocionante:
eu não só receberia uma carta, como ela viria de outro país, escrita em
outro idioma… Como se New Jersey fosse na esquina da minha casa, todos
os dias, eu esperava ansiosa que o porteiro colocasse embaixo da porta
o envelope branquinho com o selinho colorido e o carimbo vermelho com a
data.
Tenho até hoje as cartas que recebia da Nicole – sim era esse o nome
da minha penpal friend, assim como tenho guardadas muitas das cartinhas
que recebi nesses quase 30 anos de vida… Reler certas palavras, rever
letras que uma vez foram tão comuns para mim, lembrar assuntos e
segredos tão inocentes, lembrar de pessoas que já se foram… É, é disso
que eu sinto falta, de ter os sentimentos e as pessoas, de alguma
forma, para sempre presentes na minha vida.
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