quinta-feira, 10 de junho de 2010

Pequenos prazeres e nossos novos cérebros eletrônicos

“The future I so bright that I’ve got to wear shades.” Timbuk3



FOLHA - E como foi a entrada do computador em sua vida profissional?
QUINO - Não entrou nunca.

FOLHA - Não o usa de forma alguma?
QUINO - Para nada. Minha mulher o usa, mas eu não. Sou analfabeto em tudo isso.

FOLHA - E tem alguma opinião sobre tecnologia?
QUINO - Acho que veio para mudar as relações humanas, de fato. Porque as pessoas não se comunicam mais com seus vizinhos, mas com gente que está muito longe.

FOLHA - E acha que isso é mal para os jovens?
QUINO - Para eles, não, porque já nascem lidando com essas tecnologias. O problema é para os que viram outro modo de se comunicar.

FOLHA - Você se sente de alguma forma distanciado ou excluído por causa disso?
QUINO - Excluído, sim. Porque, por exemplo, na Europa é muito comum que você vá ao correio e não haja uma pessoa para atendê-lo. Você tem que ir a uma máquina, pesar a carta, ver quanto tem que pagar e tudo o mais, sem encontrar uma pessoa para lhe dizer que gostou do seu penteado hoje. Não há mais contato com nada.

(Cartunista Quino, 77 anos, em entrevista à Folha de S. Paulo)


Então... Se é verdade que a internet ajudou e ajuda muito em várias situações, é bem verdade também que muitas coisas foram meio que "acabadas" com a criação da rede.

Óbvio que o Google facilitou a vida da gente. Digite qualquer coisa que precise saber ou mesmo seu nome completo ali que tudo relacionado ao assunto aparece na sua tela. Claro que a comunicação ficou bem mais rápida e ilimitada, pois, ainda que você esteja no Butão ou nos confins da floresta amazônica, com um notebook e alguns poucos aparatos tecnológicos, você pode mandar notícias pra sua família, conversar com seu namorado, atualizar seu Twitter... Enfim, são muitas as vantagens, porém...

Você se lembra há quanto tempo não recebe nem lê uma carta escrita à mão por um amigo ou parente? Ou mesmo, há quanto tempo não recebe um telefonema apenas para conversar, não com um operador de telemarketing do outro lado da linha tentando te vender um novo plano da Tim, Claro, ou qualquer outra coisa dessas?

Pois é, com o e-mail, as páginas de "relacionamento" e as outras "novas" formas de comunicação, tudo se resume a mensagens curtas, recados... Não há mais a ansiedade à espera de uma carta com notícias daquele seu amigo que está morando na Bahia, não há mais a emoção de receber a notícia de que sua filha, que agora mora no Canadá, teve um bebê e está te mandando a primeira foto da netinha.

Mesmo o simples fato de sair para comer, beber e conversar com os amigos praticamente não existe mais. Agora, todo mundo usa o MSN para discutir sobre quem está melhor no Campeonato Brasileiro ou quem vai ganhar a Copa do Mundo, tendo ao lado seu copo de coca ou cerveja, um sanduíche qualquer e contando com as pesquisas, gráficos e especulações encontradas no Google para embasar seus argumentos.

É, o Google, também acabou com a nossa "saudosa" enciclopédia Barsa. E a Britânica? E a coleção Conhecer? Ler é saber... Quem não se lembra? Todo ano, no meu colégio, os vendedores faziam reunião com os pais para vender enciclopédias... Nosso sonho de consumo era ter uma enciclopédia Barsa, caríssima na época! Hoje, quem vai perder tempo e dinheiro, comprando enciclopédia e consultando. "Coloca no Google que, em menos de dois segundos, ele é capaz de te mostrar mais de mil referências. Isso sem falar na Wikipedia.

Falando em conhecimento, enciclopédia, MSN, que idioma é esse que se fala na internet? Vlw, flw, miguxa, muitaaum, naum... Às vezes, tenho a impressão de que estamos voltando pra algum tempo perdido no passado e, ao invés de evoluir, a língua está ficando cada vez mais próxima dos primatas que falavam "Uga-uga".

E aquela sensação deliciosa de comprar um CD ou LP novo, abrir, ver todas as informações do encarte, colocar pra tocar e ouvir, pela primeira vez, aquela faixa escondida que só dava pra encontrar, se esquecesse, por acaso, o álbum tocando e, depois de 15 minutos, a banda ressuscitava com uma bela surpresa... Isso não existe mais. Antes mesmo de a gravadora começar a distribuir o CD pra loja, ele já está disponível nos sites de download ou mesmo no site do artista, inteirinho, com todas as faixas e mais algumas...

Enfim, ainda que a gente tente manter antigos costumes, como mandar cartas para os amigos ou um simples cartão de Natal pelo correio, pesquisar em livros, comprar CDs e LPs, muitos dos nossos pequenos prazeres foram perdidos com a internet, ou melhor, na verdade, novos prazeres são adquiridos a cada dia. Bons? Ruins? Úteis? Inúteis? Quem é que sabe...

Um comentário:

omicrobio disse...

e o cheiro do disco ou do cd novo? Que cheiro!

Lembro até hoje do cheiro da fita do roots do sepultura.

Cheiro é o que falta na internet. Odor é muito bom.