segunda-feira, 19 de julho de 2010

Rap é compromisso

O rap sempre foi ignorado pelos veículos de comunicação e pela sociedade em geral. Agora, o Estadão diz que ele está em crise. Como assim?

Pra quem não sabe o rap é um dos elementos do Movimento Hip Hop, que teve origem nos Estados Unidos paralelamente ao Movimento dos Direitos Civis. A ideia era, além de divulgar o que acontecia nos "guetos" - locais habitados por afro-americanos, hispânicos, enfim imigrantes legais ou não -, promover uma disputa entre gangues que acabaram por se formar nesses locais, porém utiliando a arte e a criatividade.

Kool Herc, considerado o pai do hip hop, foi o responsável para o desenvolvimento do DJ. Nascido na Jamaica, trouxe para as block parties do Bronx os tradicionais Soundsystem, que inicialmente tocavam reggae, soul e funk. Foi ele o primeiro a usar dois toca-discos e a girar os pratos pra frente e pra trás, além de usar o microfone para animar as festas, receber os amigos, como um mestre de cerimônias (daí o MC), dando uma nova cara à música.

Graças a essas quebras nas músicas, causadas pelas pausas nos toca-discos e nos giros, surge também um novo jeito de dançar: o break, dança em que os artistas quebram movimentos de acordo com a batida.

Até então, os elementos seguiam isolados, cada um em seu estilo.

Foi Afrika Bambaataa, DJ e criador da Zulu Nation, porém o responsável pela reunião dos elementos dos dos elementos da cultura hip hop e pela organização do hip hop como movimento cultural. O objetivo era tirar o caráter negativo das gangues e das disputas entre elas (que já tomava proporções maiores, saindo do gueto e tornando-se uma disputa entre Costa Leste e Costa Oeste americanas) e fazer com que cada um pudesse mostrar suas habilidades artísticas da melhos maneira. Óbvio que, desse modo, a disputa saía, em parte, das armas e se tornava uma disputa de ideias, de criatividade, enfim...

No Brasil, o movimento só chegou na década de 1980, principalmente por meio da dança e de artistas internacionais como Michael Jackson, que trouxe passos do break. Assim, passaram a ser promovidos bailes pela Chic Show, Black Mad e Zimbabwe, além das tradicionais rodas de break da São Bento, o que fez com que a procura pelas músicas dos bailes aumentasse.

Consequentemente, mais tarde, surgiriam Thaíde e DJ Hum (que já participavam das primeiras rodas de break da São Bento), Mc Jack, Pepeu, Racionais, primeiros artistas a gravarem rap em vinil no Brasil.

Fato é que, no Brasil, o movimento hip hop, não só o rap, esteve sempre legado ao underground. Nunca foi categoria de prêmio (a não ser pra mostrar "Olha, os Racionais não aparecem em lugar nenhum, mas vão aparecer na MTV esse ano"), nunca esteve na TV, nunca esteve no rádio (a não ser nas rádios pirata), nunca esteve nas grandes casas de show, enfim "nunca nada", por isso quando o Estadão afirma que o rap está em crise, acho um engano.

O rap continua aí, cumprindo seu papel de disputar ideias com criatividade, ainda que poucos fiquem sabendo.

Sim, como diz a matéria, esse ano não haverá o tradicional Indie Hip Hop no Sesc Santo André, mas... no dia 16 de julho, em Jacareí, aconteceu a Rua do Flow, com batalha de MCs, lançamento de CD do Marechal... a partir de 29 de julho, o Sesc Ribeirão Preto promove um Festival de Cultura Hip Hop.

E aí, o rap tá em crise?

Kamau e E.M.I.C.I.D.A não param de fazer show. E aí, o rap tá em crise?

Condenaram o assassino de Sabotage
. E aí, o rap tá em crise?

Culto Racional, Face da Morte, Ments Criminals, DBS lançaram CD e música nova. E aí, o rap tá em crise?

Elo da Corrente, KL Jay, MZK, Rincon Sapiencia, Funk Buia, Sombra, Sandrão, Rashid e muitos outros têm feitos shows toda semana no centro de São Paulo, como na Matilha Cultural, no Bleecker, etc. E aí, o rap tá em crise?

No Ibirapuera, está rolando uma exposição de arte urbana contemporânea, reunindo os principais grafiteiros da atualidade. Na Matilha Cultural, está em cartaz a mostra Urbanidades que apresenta produções audiovisuais ligadas ao s temas do hip hop , do cinema ao pixo, passando pela música, dança, questões sociais. E aí, o rap tá em crise?

Em agosto, ocorre mais uma vez o Prêmio Hutuz. E aí, o rap tá em crise?

E agora?

Na verdade, acho o que o Estadão tentou fazer foi colocar periferia contra periferia (não sei a troco de quê, mas...), afinal funk e rap têm origens parecidas, são manifestações feitas na periferia para a periferia, e cada um ouve o que quer, ouvir uma coisa não exclui a outra! Ou, simplesmente, como fazem sempre, fizeram mais uma matéria sem o mínimo de embasamento, nenhuma pesquisa, nenhum conhecimento antes de falar. Uma lida rápido no Central Hip Hop, no Rap Nacional, e a matéria teria sido sobre como o rap sobrevive sem aparecer, não?

Não ser o 50 Cent ("50 cent? Não dou 1 real. Sou mais o Rap Nacional." Sérgio Vaz), não ser o que são os rappers americanos, não representar financeiramente o que eles representam, estar fora da mídia, não significa que o rap esteja em crise. Se fosse assim, ele já teria nascido em crise no Brasil.

2 comentários:

omicrobio disse...

tive a mesma imoressão ao ler a matéria do estadão - ia escrever sobre isso no blog.

esquisito, não é? só por que tem aqueles que só querem pegar as meninas com bundda de fora, falam que o RAP está em crise. Em crise está o estadão.

)_ ps achei a nova cara do blog bem legal (embora a outra fosse da hora tb)

Poti disse...

Pois é, micróbio, acho que o jornalismo todo está em crise.
E agora, você acaba de me deixar também em crise. Eu troquei o layout do blog, mas comecei a achar muito cheguei. Quando eu tava pensando em trocar por algum outro mais sóbrio, você me diz que achou bem legal! Assim, fica difícil. rs...